A importância do ensino profissional para o desenvolvimento do país


Foto: Marcela Tainã – Geóloga e fundadora da Academia da Mineração

A importância dos profissionais de nível técnico nas empresas é indiscutível. Eles desempenham um papel fundamental no funcionamento eficiente e eficaz das organizações, trazendo conhecimento especializado e habilidades práticas para diversas áreas de atuação. Investir em um plano de aperfeiçoamento e desenvolvimento profissional para esses colaboradores é essencial para garantir sua atualização constante e aprimoramento de suas competências.

O plano de aperfeiçoamento visa melhorar as habilidades técnicas e comportamentais dos profissionais, capacitando-os para lidar com desafios cada vez mais complexos no ambiente de trabalho. Já o plano de desenvolvimento profissional tem como objetivo promover o crescimento contínuo desses colaboradores, preparando-os para assumir novas responsabilidades e cargos de maior hierarquia no futuro. Ao investir nesses planos, as empresas demonstram seu compromisso com o crescimento e a valorização de seus profissionais de nível técnico, contribuindo para o sucesso e a competitividade do negócio no mercado.

Porém, apesar de indiscutível a importância, o que a prática mostra é que a maioria dos profissionais de nível técnico, busca o ensino superior em um entendimento de ser este o próximo passo para a sua ascensão profissional, seja na empresa onde atua ou na busca por outras oportunidades. Para discutir esse contexto é importante fazer uma viagem por um passado recente e entender a formação profissional desde 1906.

No final do século XIX e início do século XX, as condições socioeconômicas do país impulsionaram a necessidade de estabelecer e expandir institutos de ensino técnico e profissional. O presidente Affonso Augusto Moreira Penna, durante seu mandato de 15 de novembro de 1906 a 14 de junho de 1909, reconheceu a importância dessas instituições para o progresso das indústrias, ao afirmar que a criação e multiplicação delas poderiam fornecer mestres e operários qualificados. Com esse propósito, o governo promulgou a Lei nº 1.606 em 29 de dezembro de 1906, que estabeleceu a criação do Ministério dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio, responsável, entre outros temas, pelo ensino profissional.

A Lei nº 1.606 de 1906, ao instituir essa nova secretaria de Estado, demonstrou o interesse do governo em fomentar a formação profissional. No entanto, apesar desse avanço, o texto da lei também revelou uma divisão entre a preparação para o trabalho e a educação tradicional. A criação de um ministério específico para supervisionar o ensino profissional contrastava com a subordinação desse setor ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, evidenciando  certa dicotomia na abordagem governamental da época em relação à educação e formação profissional.

A atuação educacional voltada para o ensino acadêmico era responsabilidade do Ministério da Justiça e Negócios Interiores, um órgão federal. Essa distinção entre formação acadêmica e profissional, que remonta a um preconceito histórico, ainda persiste de forma velada, destacando a separação entre trabalho e conhecimento propedêutico. A dicotomia entre educação teórica para as classes dirigentes e formação prática para as classes populares era reforçada pela divisão administrativa do governo federal em ministérios distintos, perpetuando a desigualdade educacional.

A segregação entre formação profissional e acadêmica, marcada pelo preconceito em relação à importância intelectual da educação profissional, influenciou a estrutura das escolas por muitos anos. Nesse contexto histórico, foi estabelecido o embasamento legal para a criação de institutos de ensino técnico e profissional no Brasil.

Quase três anos após a edição da Lei nº 1.606, o presidente Nilo Peçanha  baixou o Decreto nº 7.566, de 23 de setembro de 1909, criando as Escolas de Aprendizes Artífices que, com o passar do tempo, acabaram por compor a rede de escolas federais de ensino técnico profissional.

Composto por dezoito artigos, a localização geográfica dessas escolas foi disciplinada logo no primeiro deles, com a seguinte redação:

“Em cada uma das capitaes dos Estados da República o Governo Federal manterá, por intermédio do Ministerio da Agricultura, Industria e Commercio, uma Escola de Aprendizes Artifices, destinada ao ensino profissional primario e gratuito.”

Caracterizava-se, portanto, o início da intervenção do estado brasileiro na formação da força de trabalho nacional.

Antes de voltarmos aos tempos atuais, é importante destacar um momento importante, que coloca novamente um novo panorama sobre o ensino técnico. Por volta de 1920, o engenheiro João Lüderitz, diretor do Instituto Parobé (POA-RS), e seus colegas percorreram as EAAs do país, observando uma grande deterioração dessas instituições. Para eles, essa situação guardava relação com o desvio de suas finalidades originais, já que elas haviam sido criadas como estratégia para a integração da população no desenvolvimento industrial do país e não como fator de profilaxia social voltada aos desocupados e vadios, como vinha acontecendo.

A organização do ensino técnico profissional no Brasil antes da década de 1930 foi influenciada por circunstâncias específicas, como mencionado anteriormente. Embora as Escolas de Aprendizes Artífices tenham tido um papel relevante, foram as ações decorrentes de sua existência e funcionamento que deram origem ao debate sobre o ensino técnico industrial. Com o crescimento da indústria e a economia de guerra, durante a transição do governo constitucionalista (1934-1937) para o Estado Novo (1937-1945), ocorreram mudanças políticas significativas na sociedade brasileira. Nesse contexto, a Reforma Capanema de 1942 e a segunda reforma da Era Vargas marcaram transformações relevantes. A partir de então, a educação propedêutica e a profissional foram separadas, limitando as oportunidades educacionais e sociais para a classe trabalhadora, ao focar a educação profissional no trabalho manual.

A partir de janeiro de 1943, as escolas técnicas industriais mantidas pela União enviaram seus planos de trabalho ao Ministério da Educação e Saúde Pública, descrevendo o financiamento regular dos cursos industriais e de mestria, além dos cursos técnicos, em conformidade com o Regulamento dos Quadros dos Cursos de Ensino Industrial, estabelecido pelo Decreto nº 8.673 de 3 de fevereiro de 1942. Os cursos de mestria e industriais abrangiam diversas áreas, como trabalhos com metal, indústria mecânica, artes industriais, eletrotécnica, indústria de construções e artes gráficas. Por outro lado, os cursos técnicos programados para 1943 estavam concentrados em seções como indústria mecânica, eletrotécnica, indústria de construções e artes industriais.

Apesar das mudanças na Lei Orgânica do Ensino Industrial e suas ramificações, incluindo a alteração de denominações, algumas escolas industriais (antigos Liceus) levaram um tempo para adotar o novo nome de Escolas Técnicas. Nesse ponto cabe distinguirmos os Aprendizes Artífices dos Técnicos.

Para entender a distinção entre técnicos e tecnólogos vamos apresentar alguns marcos legais:

1959 – Foram instituídas as escolas técnicas federais como autarquias, a partir das escolas industriais e técnicas mantidas pelo Governo Federal.

1968 – A Lei Federal nº 5.540, de 28 de novembro de 1968 permite oferta de cursos superiores destinados à formação de Tecnólogos

1971– A Lei nº 5.692/71 definiu que todo o ensino de segundo grau, hoje denominado ensino médio, deveria conduzir o educando à conclusão de uma habilitação profissional técnica ou, ao menos, de auxiliar técnico (habilitação parcial).

1978 – As Escolas Técnicas Federais do Paraná, do Rio de Janeiro e de Minas Gerais foram transformadas em Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets), pela Lei nº 6.545, de 30 de junho.

1994 – Foi instituído o Sistema Nacional de Educação Tecnológica, integrado pela Rede Federal e pelas redes ou escolas congêneres dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Na Rede Federal houve transformação gradativa das escolas técnicas federais e das escolas agrícolas federais em Cefets.

1996 – Em 20 de dezembro de 1996 foi promulgada a segunda Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que dedicou o Capítulo III do seu Título VI à educação profissional. Posteriormente esse capítulo foi denominado “Da Educação Profissional e Tecnológica” pela Lei nº 11.741/2008, que incluí a seção IV-A no Capítulo II, para tratar especificamente da educação profissional técnica de nível médio;

Na postulação da LDB, passou-se a designar os cursos técnicos como programas de nível médio, com o propósito de capacitar o aluno proporcionando conhecimentos teóricos e práticos nas diversas atividades do setor produtivo, e os cursos tecnológicos como de nível superior

Importa ressaltar, ainda, que na Nova Lei de Diretrizes e Base o ensino técnico não mais se dissociava da formação educacional de caráter geral, uma vez que o ensino técnico, específico, só poderia ocorrer após os dois primeiros anos de formação generalista, tradicional. Dessa forma, a antiga separação entre educação profissional e a educação formal, entregues a dois Ministérios distintos, foi diminuída, passando a sua condução a ser regida de forma mais integrada por um único Ministério,

Nesse ponto, apesar da história resumida, podemos entender as origens do papel do técnico e do avanço de carreira.

Ainda hoje, um dos pontos cruciais a serem discutidos é a persistente distinção entre o ensino superior e o profissional. Essa disparidade enraizada muitas vezes leva à crença equivocada de que os profissionais técnicos não possuem a capacidade necessária para assumir cargos analíticos ou de gestão.

Essa visão ultrapassada acaba por desvalorizar o ensino técnico e limitar as oportunidades de crescimento profissional para esses indivíduos. A verdade é que os técnicos, com sua formação específica e habilidades práticas, podem desempenhar papéis de liderança com competência e eficácia. É essencial desafiar esses preconceitos e promover a valorização do ensino técnico, reconhecendo sua importância e relevância no mercado de trabalho contemporâneo.

Esse cenário reflete a necessidade de superar as barreiras impostas pelo preconceito e promover uma educação mais inclusiva e igualitária, valorizando tanto a formação acadêmica quanto a profissional.

É fundamental destacar a importância do ensino profissionalizante e do aprimoramento contínuo, sem desmerecer o ensino superior. E, mais importante ainda, sem insinuar qualquer ideia de hierarquia educacional. O ensino profissionalizante desempenha um papel crucial na formação de profissionais qualificados e capacitados para atender às demandas do mercado de trabalho. Esse modelo de educação oferece oportunidades para o desenvolvimento de habilidades técnicas específicas, preparando os estudantes para ingressarem em diversas áreas profissionais com competência e segurança.

Ao valorizarmos o ensino profissionalizante, não estamos diminuindo a importância do ensino superior, mas apenas reconhecendo a diversidade de caminhos educacionais e profissionais que os indivíduos podem seguir. Todas as modalidades de ensino têm seu próprio mérito. Portanto, é essencial promover uma visão inclusiva e abrangente da educação, que valorize todas as formas de aprendizado e permita que cada indivíduo escolha o caminho que melhor se adeque às suas aptidões e interesses.

 

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