Patrícia Boson – Coordenadora da Comissão Técnica de Recursos Hídricos e Saneamento e membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente – Conama
É de 1981 a Lei n.º 6.938, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, PNMA. Considerando que a primeira Conferência Mundial do Meio Ambiente foi em 1972, período em que vivíamos sujeitos a pouca abertura para as discussões democráticas, não restam dúvidas de que a instituição da PNMA foi um passo progressista gigantesco.
A Lei, vigente até hoje, com pequenas alterações, além de avançada para o seu tempo, trouxe também instrumentos modernos para o alcance dos objetivos. São ao todo 13, sendo, a maioria, voltada para a formação de um robusto banco de informações ambientais, que por sua vez integram os instrumentos de planejamento e ordenamento territorial. Outros instrumentos constituem incentivos a boas práticas; por último, quatro, que se denominam instrumentos de controle.
Em se considerando a triste verdade de que a falta de planejamento é um problema cultural no Brasil, assim como é míope o nosso apego à burocracia do controle, usado como mecanismo de concentração de poder em mãos de poucos, atrelada à gula por tarifação e taxação, nem é preciso dizer que os de controle foram os únicos instrumentos que se firmaram no País. Esses, com ênfase no licenciamento ambiental, instrumento com a função de mensurar, mitigar e prevenir os potenciais impactos ambientais advindos de um determinado empreendimento, e que tem, como referência, para a avaliação dos impactos, o ordenamento territorial. Definidor da capacidade de suporte ambiental, e, assim, a vocação econômica mais adequada e o como conduzi-la.
Exemplificando, em um empreendimento minerário, não cabe ao licenciamento definir se pode ou não minerar naquela região, porque a mineração é uma concessão pública que já foi dada a um determinado empreendedor com base em instrumentos do ordenamento territorial. O licenciamento portanto, limita-se à análise de um projeto minerário específico e, se esse projeto obedece, ou não, determinadas circunstâncias e condições impositivas.
O licenciamento ambiental foi, em síntese, o único instrumento da PNMA implementado com abrangência nacional, e, sobre ele recaiu as ausências de todos os demais. Assim, tornou-se depositário de funções para as quais não está adequadamente talhado, transformando-se em um poderoso instrumento cartorial e de poder para poucos grupos e instituições.
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Escrevo esse preâmbulo com vistas a pôr em evidência o PL Nº 2159, que tramita no Senado Federal, desde 2021, e que busca estabelecer normas gerais para o licenciamento em todo o território nacional. A demora para aprovação desse PL não é compatível com a urgência e as necessidades do País, especialmente em infraestrutura de transporte e saneamento. Hoje, inúmeros projetos são inviabilizados pela burocracia do controle ambiental, institucionalizada em várias unidades da federação. Como também, essa demora, não condiz com os inúmeros avanços do Projeto, como o de dar maior ênfase aos fundamentos da proteção ambiental e menor ênfase aos carimbos do controle.
Insta consignar que uma das manobras que usam para travar o avanço na tramitação do PL é a definição de baixo, média e alto impacto que se desdobra na indicação de um licenciamento auto declaratório, ou simples, ou complexo ou até mesmo dispensável. Os que contestam a forma posta, querem que, de Brasília, sejam tomadas decisões sobre todo o território nacional, de feições continentais, com o argumento de uma desqualificação, a priori, da capacidade de os Estados e Municípios, conhecedores de seus respectivos territórios, para essa função.
Em suma: a aprovação do PL Nº 2159 é urgente. Não ter regularização alguma de âmbito nacional, ou, pior, o caos institucionalizado, atende grupos, mas não atende ao meio ambiente e à Nação.