Ana Paula Mello
Li um artigo recente, publicado pela “Deutsche Welle”, agência de notícias alemã, sobre “como a agricultura pode se tornar uma protetora do clima”, e fiquei interessada em saber o que esse método traz de novidade.
O artigo inicia tratando da importância do solo na absorção de carbono, bem como do húmus, aquela camada fértil que resulta da decomposição da matéria orgânica, que armazena cerca de quatro vezes mais carbono que o presente na atmosfera sob a forma de CO2, e que a constante utilização da terra com práticas agrícolas convencionais reduz. Mas a solução vem logo a seguir: “Por meio da rotação das culturas e da incorporação de resíduos vegetais, os agricultores podem preservar e aumentar a quantidade de húmus, e, dessa forma, também a fertilidade natural do solo”.
É importante ressaltar que o artigo da agência alemã fala de agricultura de forma genérica, no mundo. Nesse ponto, o Brasil se destaca de forma monumental, tendo desenvolvido tecnologias capazes de gerar múltiplos cultivos, inclusive de forma integrada, com grãos e pasto na mesma área, bem como produção florestal.
Manchetes, no final da década de 60, destacavam a escassez alimentar no Brasil. Porém, em 40 anos, sextuplicamos a produção de grãos, utilizando o dobro da área. Isso teve consequências em diversas áreas e setores da economia e do bem-estar humano, e foi possível por meio da pesquisa e da tecnologia.
No quesito mudanças climáticas, a agricultura foi pioneira, ao elaborar plano setorial para mitigação de emissões e adaptação – o Plano ABC, com tecnologias. Uma delas é o sistema de plantio direto, que potencializa o estoque de carbono no solo por meio da incorporação de restos de cultura e não revolvimento.
Outra tecnologia é a integração lavoura-pecuária-floresta, em que cultivos diferentes são feitos em mesma área e de forma integrada com a pecuária e a floresta. Outra é a fixação biológica de nitrogênio, muito comum nos plantios de soja, permitindo a absorção direta do nitrogênio que temos de sobra no ar e utilização pela planta, por meio de bactérias inoculadas.
Há outras tecnologias do Plano ABC, bem como diversas outras técnicas como agricultura de precisão, manejo integrado de pragas e doenças, agricultura orgânica, práticas conservacionistas de solo e água e uma gama de boas práticas, isso tudo sem falar ainda na manutenção de, no mínimo, as áreas de vegetação nativa que a legislação preconiza. Portanto, sim, é correto dizer que a agricultura tropical brasileira tem papel importante para as nossas metas de acordos climáticos. É na agricultura que se torna possível o balanço de carbono com mais remoção que emissão.
Outro ponto é a capacidade que tem o reflorestamento (que, por sua vez, eleva a produção de húmus no solo), de reter bilhões de toneladas de CO2. Feliz coincidência a agricultura brasileira ter um código florestal que determinou Programas de Regularização Ambiental (PRA), com o objetivo de recuperar vegetação nativa em todos os biomas. Isso, somado a toda vegetação nativa existente, configura um majestoso estoque de carbono.
O artigo europeu menciona ainda o uso do “biochar” (o nosso famoso carvão vegetal) no solo, aumentando sua fertilidade e com potencial de armazenar bilhões de toneladas de CO2. Outra alegria brasileira a compartilhar com o mundo. Aqui, as siderúrgicas usam carvão vegetal como fonte de energia, e esse carvão vegetal é oriundo de produção florestal com uso de espécies de crescimento rápido, notadamente o eucalipto.
Quanto às pastagens, ainda há muito o que melhorar, especialmente no acesso dos produtores à assistência técnica e gerencial, para a conversão de pastos muitas vezes degradados em produtivos. Isso impacta uma série de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – desde a educação, saúde, clima, renda, agricultura sustentável etc.
As tecnologias, como dito, existem; a grande questão é o acesso por mais e mais homens e mulheres do campo. Assim, nossas fazendas com pastagens são capazes de produzir proteína animal, grãos (rotação), lenha e energia, estoque de carbono, água, biodiversidade e diversos outros serviços ecossistêmicos. O Brasil é, incontestavelmente, uma potência mundial agropecuária, florestal e ambiental.
Ana Paula Mello é engenheira ambiental e coordenadora da assessoria de Meio Ambiente da Federação da Agricultura no Estado de Minas Gerais (Faemg)