Muitas cidades cresceram no entorno das ferrovias. Essa é uma constatação ainda mais visível no interior de Minas Gerais. Há certo romantismo nesse cenário, tão próprio do estado. Poucos sabem, no entanto, das dificuldades enfrentadas por quem atua no setor. Com o avanço do processo de concessão de novas linhas e a recuperação de outras tantas, o problema ganha visibilidade. A carência de profissionais qualificados é um gargalo urgente. “Faltam profissionais capacitados. Precisamos treiná-los após contratação. E isso leva tempo. Não há curva de aprendizado, temos apenas tempo para fazer e entregar. “Será que as universidades estão preparadas para uma grande demanda?”, questionou o engenheiro Danilo Guedes, especialista em infraestrutura da MRS Logística.
Foto: Danilo Guedes, especialista em infraestrutura da MRS.
Danilo e o colega Bernardo Araugio apresentaram a palestra Portfolio de obras de Mobilidade Urbana previstas em Minas Gerais e principais desafios encontrados, no seminário Minas de volta à mobilidade, realizado no dia 26 de janeiro pela SME, em Belo Horizonte. A demanda é compatível ao volume de trabalho. São estudos de tráfego, alargamentos de pontes, construções de viadutos, passagens em nível, otimizações de traçado e renovação de trechos de vias permanentes, entre outras obras.
Foto: Bernardo Araugio, gestor de projetos da MRS
Além de necessidade de mão de obra qualificada, há um entrave importante à transposição de ferrovias com boa integração junto às comunidades: a responsabilidade do poder público. “Nossos projetos têm requisitos de acessibilidade, mas o entorno não é acessível. Respeitamos as normas técnicas. Cabe ao município o investimento para que pessoas com deficiência tenham mobilidade integral. Precisamos evoluir nesse sentido, com o investimento do Executivo e a fiscalização do Legislativo e de outros órgãos de controle”, considera Bernardo.
A MRS administra uma malha ferroviária de 1.643 km nos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Quase 20% de tudo o que o Brasil exporta e um terço de toda a carga transportada por trens no país passam pelos trilhos da companhia.
Foto: Henrique Sperandio Cremm, especialista em ferrovias da CPTM
CPTM
O segundo painel do dia foi apresentado pelo engenheiro especialista em ferrovias Henrique Sperandio Cremm, chefe de departamento de projetos de infraestrutura e superestrutura ferroviária da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Henrique estava em viagem de trabalho, e falou da Turquia por transmissão online sobre Trens regionais – via permanente e suas tecnologias. “É importante que o Brasil tenha um Plano Nacional de Características Técnicas de todo o sistema ferroviário, indisponível hoje. Essa estratégia permitirá os avanços projetados para a malha viária do país. Nem todos os modelos internacionais serão viáveis aqui”, ponderou o especialista.
Cremm vê três pilares para balizar essa discussão. O primeiro ponto a considerar, diz ele, é fugir do entendimento comum de que ferrovia de passageiros é metrô. “Precisamos nos desvencilhar deste conceito, inclusive entre nós, ferroviários”. Depois, é preciso avançar à normatização: qual o modelo de trem será implementado em maior escala? “Para isso, é preciso reunir profissionais que atuam na área, definir normas técnicas a fim de balizar projetos e execuções no país. Não apenas em São Paulo, ou Minas. Isso seria um erro”, explicou.
Por fim, e não menos importante, Cremm defende a formação de mão de obra em larga escala, nas universidades. “Hoje, isso fica sob responsabilidade das operadoras. A formação técnica e prática se dá nas empresas. Sou um exemplo disso”, disse o chefe de departamento de projetos de infraestrutura da CPTM.
A Companhia paulista tem hoje 196 quilômetros de linhas e 57 estações operacionais, atende 18 municípios e se apresenta como a melhor alternativa para atenuar o problema da mobilidade na Região Metropolitana de São Paulo, promovendo constantemente obras de melhoria e modernização do sistema ferroviário por ela administrado.
Foto: Alexandre Grossi, gerente de tecnologia da RUMO
RUMO
Na parte da tarde, a plateia teve acesso mais duas palestras. O engenheiro Alexandre Grossi, especialista ferroviário e gerente de tecnologia da RUMO falou sobre Modernização do sistema do controle de tráfego e a implantação do Positive Train Control 2.0 (PTC 2.0). Trata-se de um sistema avançado de despacho de trens projetado para trabalhar com segurança e ser capaz de determinar com precisão a localização, direção e velocidade dos trens ao longo de toda a malha.
Ele também pode atuar na frenagem de composições ferroviárias antes que ocorram acidentes relacionados a erros humanos, alertar os operadores sobre possíveis problemas e interromper a movimentação se o operador não agir. “O PTC 2.0 foi desenvolvido para prevenir ocorrências como colisões entre trens, descarrilamentos causados por excesso de velocidade, movimento não autorizado em seções da via onde existam equipes de manutenção em atividade, movimento por meio de uma máquina de chave que esteja em posição divergente à estabelecida na licença de circulação”, explicou Grossi.
A Rumo oferece soluções de logística integrada, transportando produtos país adentro e mundo afora, contribuindo com o segundo setor em diferentes áreas, como agronegócio, industrial e mineral. Guiada pela agenda ESG, está presente em nove estados, com mais de 14 mil quilômetros de ferrovias e atuação direta nos principais portos do Brasil.
Foto: Thiago Moura de Oliveira, gerente de engenharia da VLI
VLI
O segundo painel da tarde foi apresentado por Thiago Moura de Oliveira, gerente de engenharia, operação e tecnologia da VLI Multimodal, e Fernanda Deltregia, especialista em operações ferroviárias da companhia. Eles falaram sobre os Caminhos da descarbonização para o setor de transporte ferroviário de cargas. De acordo com dados da empresa, a VLI já evitou a emissão de 821 mil toneladas de CO2 para a atmosfera.
Esse esforço se deu através de programas recentes de eficiência energética e renovação da frota de locomotivas. Houve ainda melhoria em modelos de trens com tração distribuída, vagões de alta capacidade e renovação de trechos de vias permanentes. A VLI também se vale de inteligência artificial, através de análise preditiva, para minimizar erros, ter melhores diagnósticos e atacar problemas operacionais. “São sistemas que não substituem os maquinistas”, alertou Thiago.
Foto: Fernanda Deltregia, especialista em operações ferroviárias da VLI
Fernanda completou o colega e afirmou que o Brasil dispõe de soluções singulares para transição energética. Para ela, é preciso mais investimento e articulação entre o poder público e a iniciativa privada para tornar mais acessível esse conhecimento, e assim trazer desenvolvimento econômico e social ao país. “Ainda há muito a ser produzido até uma solução comercial. Não existe uma bala de prata para a descarbonização”, disse Fernanda.
A VLI é uma empresa da Vale que oferece soluções sustentáveis de logística multimodal. A companhia conecta portos, ferrovias e terminais a outros modais para atender às principais regiões brasileiras produtoras de bens industrializados, siderúrgicos, minerais e do agronegócio.
8º no ranking
O Brasil ocupa hoje a oitava posição no ranking de países com maior malha ferroviária do mundo, com 31 mil quilômetros de linhas férreas. E a 10ª em densidade da malha, com 3,1 mil de locomotivas. O modal representa 21,5% da matriz de transporte nacional de carga. “Temos que estar juntos da SME, dos engenheiros, das universidades. Vamos errar, tropeçar, fazer escolhas. É importante termos sinergia, união e compartilharmos conhecimento para abrir janelas de oportunidade e desenvolvimento”, enfatizou Thiago.
Foto: Davi Bemon, mestre em sistemas ferroviários e tração elétrica
O seminário, organizado pela Comissão Técnica de Construção Pesada e Infraestrutura da SME, contou com a colaboração do engenheiro civil Davi Bemon. Mestre em sistemas ferroviários e tração elétrica e com experiência internacional na área, ele mediou as palestras e convidou à participação do público.
Para o especialista, houve convergência de ideias em uma análise profunda da importância socioeconômica do modal. “Nesse fórum de diálogo e entendimento, forjamos vínculos que transcendem interesses individuais”. Bemon também agradeceu a entidade pela oportunidade. “Expresso minha sincera gratidão à SME, cujo papel primordial na sociedade e dedicação à representação de classe proporcionam alicerces sólidos para iniciativas de vanguarda como esta, moldando, assim, o futuro do nosso desenvolvimento coletivo”.